História do bairro se confunde com a da Portela, que vai exaltá-lo no próximo Carnaval
Por Fabiana Sobral
Rio - Para os corações que têm mania de amor pela Portela , o Carnaval de 2013 promete passar como um rio de emoções. O ti-ti-ti cresce a cada dia no bairro mais badalado do subúrbio, especialmente na fronteira com o vizinho Oswaldo Cruz: “O desfile da Azul e Branca será uma festa!”, apostam os portelenses — e até quem não é mas vive na região.
O enredo “Madureira...o meu coração se deixou levar” vai comemorar os 400 anos de Madureira, os 90 da Portela, os 70 de Paulinho da Viola — o aniversário é dia 12 agora — e os 42 anos da Velha Guarda.
O bairro, que voltou à geografia festeira da Cidade, com suas rodas de bambas, feijoadas, parque gigantesco e shows internacionais, não para de criar atrações para quem ali vive, trabalha ou se diverte.
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Madureira |
“Me encanta na escola a emoção, o entusiasmo dos portelenses”, observa o carnavalesco Paulo Menezes, que se valeu do amor de um deles, Paulinho da Viola, e a canção ‘Foi um Rio que passou em minha vida’ para construir o enredo.
“Me apeguei à imagem do Paulinho assistindo ao desfile da Portela em 1970 e a plateia cantando a música no esquenta. O enredo começa por aí, com o Paulinho maravilhado e se perguntando de onde vem o amor tão grande que ele sente pela escola. Aí ele vai para Madureira, para entender como tudo começou. E vai de trem, o segundo veio condutor do enredo”, explica Menezes.
“Ele vai para Madureira, mergulha na história, volta 400 anos, chegando à Freguesia do Irajá — terras que deram origem ao bairro”, completa. A partir daí, o enredo passeia pela história do subúrbio, sua formação, vocação comercial e cultural, e, claro, carnavalesca.
Tia Surica: "Orgulho de ser suburbana e morar ao lado da minha Portela"
Dia 17 de novembro Iranette Ferreira Barcellos, a Tia Surica, completa 72 anos de idade — e de Madureira. A simpática pastora da Velha Guarda anda exibida que só ela com o enredo que festeja suas paixões.
“Madureira é tudo de bom. Me orgulho de ser suburbana e morar ao lado da minha Portela”, diz a dona do cafofo mais querido do bairro. “Temos grande enredo. Só falta o campeonato”, torce.
Estreante na Azul e Branca, o casal de mestre-sala e porta-bandeira Robson e Ana Paula sonha alto com a Águia. “Defender o pavilhão da Portela é um sonho para nós. Vamos buscar o dez para Madureira”, promete Ana Paula.
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Tia Surica |
Miscigenação religiosa, imigrantes, camelôs e Zé Carioca vão desfilar
Se o primeiro setor do desfile busca o veio histórico, o segundo chega com a fé. A "miscigenação religiosa" de Madureira, como define Menezes, resultou nas festas de Reis, do Divino, nas casas de Umbanda e Candomblé, que geram demandas até hoje no Mercadão de Madureira.
O setor traz ao grande público a lembrança de Esther Maria Rodrigues, a grande líder espiritual daquelas bandas na primeira metade do século passado e festeira de primeira hora. Em seu quintal passaram Paulo da Portela e Pixinguinha, entre tantos bambas.
Pelo enredo ainda desfilam imigrantes judeus, árabes e italianos — responsáveis pelo veio comercial da região — e a política do bota-abaixo de Pereira Passos, que levou populares expulsos do Centro para o subúrbio. Sem falar nos camelôs. Eles não pode faltar, né?
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Paulo Menezes, carnavalesco da Portela |
Outros setores abordam a riqueza cultural do bairro, que teve até teatro da vedete Zaquia Jorge. Sem falar no personagem Zé Carioca, nascido após visita de Walt Disney ao subúrbio. O Carnaval, claro, é representado com a criação da Portela e do Império Serrano — aqui a rixa não conta —, blocos e coretos.
Ao fim, Madureira surge como inspiração de poetas — João Nogueira, Arlindo Cruz, Zeca Pagodinho... todos voltando do bairro com Paulinho, no trem do samba, onde os espera outro Paulo, o da Portela, fundador da escola. Quer emoção maior?
Enredo agita o Mercadão
O vai e vem de gente não cessa. Em meio ao labirinto de corredores que fazem os "estrangeiros" se perderem, está a pleno vapor a exaltação do bairro e, por tabela, do Mercadão, central de compras que cresceu alimentada pela demanda por artigos religiosos na região.
“Vir a Madureira e não vir ao Mercadão não tem graça. O enredo nos engrandece”, festeja Antônio Coelho, dono de loja de artigos religiosos.
A exaltação do bairro pode ser o empurrão que faltava para a recuperação de parte da história da região que vai desaparecendo em ruínas, como a casa em que morreu Paulo da Portela, na Rua Carolina Machado. “Esse patrimônio não pode se perder”, alerta.
Confira a letra do samba
Enredo: "Madureira… onde o meu coração se deixou levar"
Autores: Wanderley Monteiro, Luiz Carlos Máximo, André do Posto 7 e Toninho Nascimento
E lá vou eu cantando com a minha viola
O amor tem seus mistérios
Por onde me deixo levar
Laiá
Nossa história começa por lá
No engenho da fazenda
Dos cantos de “canaviá”
Bate o sino da capela
Ôi… que é dia de santo, sinhá
Tem mironga de jongueiro
O tambor me chamou pra dançar
Tempo rodou na roda do trem e veio
A inspiração do partideiro
Que versou no Mercadão
Foi nesse chão
Que a estrela brilhou no tablado
O “Madura” pisou no gramado
O malandro charmoso dançou
No pagode com outro gingado
Quando o bloco chegou
Agitou o suingue do black
E a nega baiana girou
Cai na folia, sem grilo, meu bem vem na fé
Na ilusão da fantasia
Vai como pode quem quer
Surgiu a serrinha imperial
Em outros caminhos para o mesmo ritual
Portela, meu orgulho suburbano
Traz os poetas soberanos nesse trem para cantar
Que Madureira é muito mais do que um lugar
É a capital de um sonho que me faz sambar
Abre a roda, chegou Madureira
A poeira já vai levantar
O batuque ginga ioiô
Ginga iaiá
Fonte: Jornal O DIA