domingo, 17 de fevereiro de 2013

Samba enredo voltou ao protagonismo com vitória da Vila


Gênero em crise, com a palavra decadência rondando-o há pelo menos década e meia, o samba-enredo voltou ao protagonismo com a vitória da Vila Isabel. Aliado ao apuro estético da Rosa Magalhães, que ressurge de um limbo imposto pelo desgaste dos últimos anos na Imperatriz Leopoldinense e pela ascensão do estilo Paulo Barros – que ela própria incorporou ao seu processo criativo, vide a alegoria do Girassol, esplêndida -, o samba de Martinho da Vila, Arlindo Cruz, André Diniz, Tonico Ferreira e Leonel foi um dos responsáveis pelo desfile retumbante da escola.
Sem ele, seria um desfile muito bonito – mas sem aquele “algo a mais” que delimita a fronteira entre um desfile histórico e um desfile comum. Há alguns anos, escrevi neste espaço que a decadência do samba-enredo insere-o na teoria da morte da canção. À luz do terceiro título da escola de Noel, gostaria de retomar este assunto, para iluminar ainda mais este momento do Carnaval. 
Foto: Carlos Moraes / Agência O Dia
Vila Isabel
O crítico musical José Ramos Tinhorão criou a expressão “morte da canção” no primeiro ano deste século; Chico Buarque deu-lhe dimensão ao encampá-la em entrevista à Folha de São Paulo, três anos depois. Por morte da canção entende-se a transformação que rompeu com os fundamentos com os alicerces que desde a década de 30 fundamentaram a música brasileira. Essa transformação é impulsionada por inovações tecnológicas e por mudanças de concepções estéticas e sociais.
Segundo o crítico José Miguel Wisnik, a canção que morreu é aquela “sofisticada melódica e harmonicamente, com letras densas e polissêmicas, intimamente entranhadas com a música, sílaba por sílaba, capaz de atingir e interessar grandes públicos, atravessar diferenças sociais, irradiando lirismo e crítica social”. Assim, o rap e a música eletrônica emergem como os gêneros mais afeitos a uma época em que a canção é coisa do passado.
Foto: André Mourão / Agência O Dia
Vila conquistou terceiro título de sua história
A morte, evidentemente, é simbólica: as canções ainda são compostas e consumidas, sobretudo as antigas; mas não têm o mesmo impacto, não exercem a mesma função de antes. As gerações seguintes perderam a ternura? A sensibilidade? Nossos ídolos ainda são os mesmos: a última grande geração da música brasileira foi a dos anos 60. O saudosismo, a exaltação ao passado é a tônica de espaços onde se ouve e discute música popular.
Adaptando a teoria ao samba-enredo, explica-se o quadro atual. A singularidade do samba da Vila Isabel deste ano é tanto pela beleza da obra, pela qualidade da letra, da melodia, mas também por ser funcional, palavra da moda para resumir a adequação aos tempos modernos, ou seja, a capacidade de proporcionar à escola um bom desfile. Por unir estética e funcionalidade, o samba-enredo da Vila Isabel oxigenou o carnaval do Rio – e o cérebro de quem acha que o samba é um dos principais componentes da linguagem das escolas de samba. 
Abre-alas da Vila impressionou pelo visual colorido | Foto: Carlos Moraes / Agência O Dia
Vila Isabel



Por Bruno Filipo.

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