domingo, 29 de janeiro de 2012

PATROCINIO NAS ESCOLAS DE SAMBA - POR FÁBIO FABATO


Por Fábio Fabato, colunista do site Galeria do Samba


PATROCÍNIO

Fábio Fabato
O ineditismo da relação Porto da Pedra-Danone


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Porto da Pedra e DANONE
Aconteceu em 1985, no Império Serrano. Lilian Rabello, à época, trabalhava com Renato Lage. Desenvolveram na escola da Serrinha um carnaval chamado "Samba, suor e cerveja - Combustível da ilusão", considerado o primeiro enredo assumidamente patrocinado da história. Foi a carnavalesca quem conseguiu a aproximação com uma famosa marca de cerveja, e que conferiu alguns caraminguás para o desfile. Confusão! À época, os patronos ficaram espantados. Temiam a perda de poder para um capital com o qual não mantinham a mesma intimidade conquistada em relação ao circulante nas ruas. O que fazer? Trataram de proibir merchandising nos desfiles, o bicho pegou para o lado de quem ostentava alguma marca, perda de pontos a torto e a direito para os ousadinhos, alvoroço. Fecharam a porteira por alguns anos, sobrou até para a genitália desnuda da Enoli Lara. Com o tempo e a reconfiguração das relações sociais e momescas, a brincadeira foi mudando de coloração. Em 2002, Salgueiro e Beija-Flor, cada qual com uma companhia aérea a tiracolo, assumiram na pele apresentações patrocinadas. Já Rosa Magalhães, ainda na Imperatriz, deu um lençol numa verba que, em teoria, deveria homenagear a cidade de Campos dos Goitacazes (RJ) com bolo, velinhas e música do Carequinha. Ora, lá se foi a antiga "Certinha de Ramos" tratar de falar de antropofagia, partindo de índios nativos que sabiam direitinho o valor nutricional da carne humana, até desembocar no Movimento Modernista. É mole?

De lá pra cá, a valsa dos carnavais vendidos seguiu a embalar o grande salão, mas poucos pararam para pensar se a lógica de associação das escolas com o capital empresarial estaria se estruturando da forma correta. A coisa passou a funcionar, a grosso modo, assim: o cara paga, compra um enredo, e leva de brinde uma hora e meia na tela da tevê, no meio desse povo. O charme marginal permanece. Foi assim que - para o ouriçar pilórico dos puristas - até mesmo o gás de Coari virou enredo. Com atraso secular com relação às co-irmãs, a Unidos do Porto da Pedra lançou o seu tema 2012. Para novo entupimento de artérias dos bandeirolas, os meses de especulação tiveram fundamento: a história do iogurte, com patrocínio da Danone, será decantada no coliseu reformado do centenário arquiteto comuna. Não vou entrar no mérito aqui se o enredo do iogurte é bacaninha ou a atividade fim do Activia (façam suas apostas, rs...), mas uma coisa é certa: a opção do Tigre, fatalmente, representa a primeira vez - "nunca antes na história desse país... - que uma marca é totalmente assumida e colocada ao lado e em pé de igualdade com o símbolo de uma escola de samba. Reparem nas logos casadinhas emoldurando a coletiva de imprensa nas imagens abaixo. Nem Vale, nem Nestlé, nem Grande Rio haviam chegado tão longe. No dia em que as Bolsas do mundo todo despencaram e Londres ardeu em chamas, a Porto da Pedra fez história no carnaval. Mas não envolveu nenhuma emoção na pista, não revivemos a aura daquele fabuloso desfile sobre os loucos (1997).

Clique para ampliar Até onde brincar com fogo e iogurte gera xixi na cama? É sob essa fantasia que as escolas devem abraçar o patrocínio? Marcas associadas a símbolos clássicos de forma tão direta, confesso, me geram certo receio. Ok, o desfile virou circo e show, espetáculo levado a meio bilhão pelos quatro cantos do planeta, tudo certo e beleza, mas a essência do "negócio" ainda é cultural: contar uma história, casar versos, emocionar uma gente. Já imaginou as escolas de samba com aqueles nomes de times de vôlei? Portela-Rexona? Mocidade-Guaraviton? Mangueira-Pfizer? Que precisamos mudar a gestão dos Grêmios, ninguém discute. Como disse meu colega de janela aqui no site e grande amigo, o jornalista Vicente Magno, "ou as escolas de samba abrem os olhos e percebem o cenário que as cerca ou algum dia poderão ser apenas pequenos grupos carnavalescos marginais, como eram no início de seus desfiles."

Clique para ampliar Mas qual o jeito certo? A associação tão visceral com uma empresa não camufla o fato de que o amadorismo no seio das agremiações ainda impera? As contas são um mistério, o produto carnaval é subaproveitado, ainda existe um certo odor de falta de regras pairando no ar. Este recente exemplo histórico do (da) Porto da Pedra denota que as escolas ainda entram de bruços nas negociações, ou assim tocará a banda daqui pra frente? Avanço ou retrocesso? Não seria melhor captar no varejo e manter o Tigre cansado de guerra como marca soberana, sem sacrifício temático? Mas quando é que as escolas estarão maduras para conseguirem uma negociação sem submissão? Perguntas que clamam por nosso cuidadoso olhar. Aos poucos, o carnaval pode estar mudando de comando, pela própria finitude do ser humano. Enquanto isso, a Vermelho-e-Branco de São Gonçalo tratou de fazer o que dela cobramos em uma década de posição coadjuvante: escreveu o seu capítulo de liderança.

Só resta saber se para o bem de todos e felicidade geral da nação. Sei não...













































































































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